Amando Amanda

Pixação de corações em um muro.
Foto: ©Renee Fisher on Unsplash

 

por Mariana Luppi*


Conheço Amanda desde que me entendo por gente, talvez porque tenha percebido que era gente pela primeira vez quando a conheci.

Era uma época em que os menininhos da escola beliscavam e puxavam os cabelos das meninas, eu devia ter uns nove ou menos. Era um dos alvos preferidos, cresci cedo, toda desengonçada – e andava pela escola todo o tempo olhando por cima dos ombros e tremendo a aproximação de qualquer um. Amanda era inspetora, bem jovem, e nunca tinha reparado nela, só mais uma adulta rondando meu mundo infantil.

Naquele dia eu tinha os cabelos presos e shorts apertando as coxas que começavam a crescer. Um menino mais velho passou correndo e, num só movimento, puxou o rabo de cavalo e apertou minha bunda – desapareceu pelos corredores tão rápido quanto surgiu. Parei sentindo o rosto esquentar, e dei um suspiro longo. Então senti uma mão fria e grande no meu ombro.

— Não deixa ele fazer isso, você não merece, tá? Isso não é amor.

A moça tinha os cabelos curtos, o rosto anguloso e magro, e algo no jeito de vestir e agir que me deixaram na dúvida por um instante – não mais do que isso – se era um homem ou uma mulher. Seu porte me impressionou tanto quanto sua frase: “isso não é amor”. Justamente na época minha mãe, tias, amigas e até professoras diziam que os meninos mexiam porque gostavam de mim.

Acho que ela perguntou o nome do menino, acho que disse que ia falar com a diretora. Só que o mais marcante já estava feito, e ela imprimiu seu meio-sorriso em minha memória. Nos meses seguintes olhava-a de esguelha pelos corredores, mas depois das férias não estava mais lá, e a memória desbotou, sem sumir jamais.

Tornou-se para mim imagem de mulher forte, e com o tempo também imagem de lésbica (que por algum motivo nunca tive dúvida de que era) – nos anos seguintes, durante a minha adolescência, sempre que via ou ouvia falar de uma “sapatão”, lembrava do seu cabelo curto e das suas roupas largas.

Dez anos depois, morava no centro da cidade e como qualquer mulher trabalhava em casa, na rua, e ainda estudava. Antes dos vinte já corria para garantir minha sobrevivência e tentar garantir meu futuro. Consegui depois de muito ir morar mais perto do trabalho, e um dia corria para pegar um ônibus novo para a universidade. Checava minha bolsa, olhava o celular, atravessava ruas aos pulos. De longe vi na praça uma figura pacata regando uma horta comunitária e cumprimentando duas senhoras que passavam com sacolas de compras. Olhei de novo o celular enquanto atravessava, e percebendo o inadmissível atraso de quinze minutos, hesitei e perguntei pelo ponto: “Direita ou esquerda aqui?”. Ela se voltou, e entre chinelos, camiseta, jeans, e um meio-sorriso, respondeu gesticulando: “Por aqui, sempre à esquerda”.

Apressei o passo no atraso, mas sentia algo no peito que era como tentar lembrar de um sonho. Peguei o ônibus e só quando sentei percebi que era ela.

Não consegui me concentrar naquele dia, roí as unhas e passei meses tentando reencontrá-la. Fiz por um mês o mesmo caminho, mesmo depois de descobrir um atalho, e bebi na praça todos os fins de semana do semestre seguinte. Não perguntei a ninguém, mas de noite antes de dormir às vezes sobrepunha o rosto da inspetora e o da mulher da praça, pensando em todas as similaridades, exceto pela pele mais gasta e pelos fios cinzas que começavam a surgir de uma das têmporas.

Naquele dia segui à esquerda e continuei seguindo. O rapaz com quem saía na época me empurrou uns meses depois e terminei tudo sem querer mais vê-lo – isso não é amor – mas só dois anos depois me tornei feminista, só depois de quatro beijei a primeira mulher.

Beijei uma, duas, três, no tempo em que beijei cinco ou seis rapazes. Sentia as diferenças, mas me agradavam igualmente, e ficava de qualquer jeito um vazio de algo.

Conheci depois Rodrigo, o último homem que me encantou. Tinha as ideias no lugar, era cuidadoso e carinhoso. Fomos morar juntos, e ela já era, aos meus 26 de novo, apenas um fantasma no fundo da minha força.

Então pouco antes dos 29 eu ainda trabalhava, em casa e na rua, ainda estudava e estava às voltas com projetos feministas. Um me levou ao interior para publicar um conto, outro às periferias da cidade, ouvir histórias de mulheres. Ainda outro me rendeu um convite para um seminário na Câmara Municipal, com mulheres de todo o país. A amiga que convidou chamou também para um jantar com as visitantes e as organizadoras, na noite da véspera. Eu, que já me cansava de Rodrigo – vidas que giravam em falso, suas necessidades na frente, preguiça que crescia entre os corpos – arrumei-me e saí feliz para conhecer mulheres.

Conversei com todas toda a noite e de quando em vez alguém perguntava de Amanda, a organizadora que mandava os e-mails e estava até aquela hora às voltas com buscar alguém no aeroporto. Quando eu já tinha comido demais, e avaliava tomar mais uma cerveja, todos os rostos se voltaram em sorrisos para a porta do restaurante.

— Essa é Amanda? – foi tudo que consegui perguntar.

Porque depois que ela chegou algo me emocionava em respirar o mesmo ar. Nesse dia seu sorriso era pleno, gesticulava acelerada, apresentava-se a todas e desabou em uma cadeira vaga na minha frente, cortando o pão com a mão e bebendo a cerveja em goles longos. Provocou umas e outras, passando a mão no cabelo já grisalho e esparramando sua presença sobre nós. Demorei e demorei, não conseguindo tirar os olhos dela, do piercing no canto do lábio inferior, das várias argolas nas orelhas, do corpo esguio e dos olhos vivos. Voltei para casa sem ver nada, e só voltei a enxergar no dia seguinte, quando o seminário começava e a vi presa em um laptop em uma das fileiras da frente. Fiz de tudo para distrair-me, mas no almoço forcei sentar-me ao seu lado, e pousei distraída a mão em suas costas, não conseguindo mais lidar com a distância. A tarde fui me aproximando, fiquei de pé ao seu lado, sentei atrás e passei a assistir tudo atravessado por seu perfil. Depois do evento saímos todas, bebemos e conversamos, e não saí do seu lado, mesmo sem receber sinal que me autorizasse a avançar.

Ela foi embora, apertei sua mão na despedida e depois fui dançar, cheguei em casa com a manhã e chorando muito. Sonhei com ela, e nos dias seguintes fiquei entre humores de melancolia e de alegria extrema. Tentei escrever para ela centenas de mensagens, que apagava em seguida. Tive ideias de eventos, contos, livros e filmes, parei horas na frente da televisão sem ver nada. Ouvi músicas românticas dançando violentamente, fiquei deitada horas sem conseguir dormir, dormi dias sem conseguir sair da cama.

Rodrigo reparava meu jeito e me deu tempo e mais tempo, até que um dia perguntou direto, se eu não o amava mais, se amava outra pessoa. Sim e sim, e uma mulher. Baixou a cabeça e assentindo foi-se para não voltar mais.

Umas semanas depois Amanda me escreveu, contando que ia viajar uns meses, conhecer a América Latina, quando voltasse nos falávamos.

Foram os melhores anos da minha vida – agora eu era independente, sabia o que queria e me sentia cada dia mais forte. Amanda viajava muito, mas sempre mandava fotos, e uma ou duas vezes por ano reunia algumas amigas para beber e conversar – fui ficando nesse círculo só de respondê-la sempre e estar sempre disposta a vê-la. Uma das vezes ficamos sozinhas na madrugada bebendo numas escadarias do centro sob uma lua extraordinariamente iluminada. Ela coçou uma das bochechas, deixando a pele vermelha, e encostei a latinha de cerveja para aliviar. Estávamos tão perto, mas ela olhava o céu. Nesse dia conversamos por horas e horas, e eu tinha a sensação que passaria a vida conversando com ela. Depois de muito extrai que de fato ela trabalhara na escola da minha infância, o que rendeu alguns “como você é nova!”. Fiz toda uma cena fingindo que lembrava naquele momento do dia em que ela me aconselhou – então ficou vermelha e abriu seu meio-sorriso encabulado. Acho que percebeu que eu estava apaixonada, olhou-me com ternura e despediu-se com tristeza. No outro dia disse que não estava bem para amar, e sumiu por outros meses em suas viagens.

Nesses anos namorei duas mulheres que amei muito, com caminhos que se cruzaram mas não seguiram os meus. Uma delas cheguei a levar para conhecer Amanda, que ainda assim me acelerava o coração, mesmo depois de tantos anos. Seguíamos conversando por horas, por mensagens ou ligações, com grandes intervalos, e nos vendo de raro em raro. Seguia minha vida e ela me inspirava todo o dia – eu guardava algumas fotos como tesouro no fundo do computador.

Foram anos de colaboração intelectual, traduzimos, escrevemos artigos, e organizamos mais um ou outro evento juntas. Foram anos também em que só pensar nela renovava minhas forças. Uma meia dúzia de vezes me salvou: quando fiquei muito abalada por um feminicídio – isso não é amor –, quando minha mãe e minha tia brigaram feio – somos criadas para competir – quando estava assustada com a política – sempre à esquerda.

Ainda sentia saudades todos os dias quando, aos meus 39, me chamou para sua festa de aposentadoria, ia parar de viajar, e morar no centro há metros daquela velha horta comunitária. Quase vizinhas, começamos regando as plantas todas as manhãs, depois tomando cafés, e depois jantando juntas sempre. A convivência constante com alguém que sempre esteve em meu coração foi fazendo meus dias leves de não conseguir mais envelhecer.

Amanda foi a pessoa que eu amei, a vida toda, a mulher que mais fez parte de mim, foi a mulher que amei amando ser mulher. Só anos depois ela aceitou meu beijo, e me olhava em sua velhice, entre as plantas do nosso jardim, ainda com seu meio-sorriso, sempre me tratando de menina e sempre um pouco surpresa com o meu amor.

Mariana Luppi, comunista desde os 14 anos, atualmente militante feminista e ecossocialista, formou-se em filosofia e hoje escreve, estuda e milita nos intervalos do seu trabalho burocrático kafkiano.


Amando Amanda

(versão em espanhol)

Conozco a Amanda desde que me entiendo por gente, tal vez porque haya percibido que era gente por primera vez cuando la conocí.

Era una época en que los niños de la escuela pellizcaban y tiraban los cabellos de las niñas, yo debía tener unos nueve o menos. Era uno de los blancos preferidos, crecí temprano, desgarbada y andaba por la escuela todo el tiempo mirando por encima de los hombros y temerosa de la aproximación de cualquiera. Amanda era inspectora, muy joven, y nunca había reparado en ella, sólo una adulta rondando mi mundo infantil.

En aquel día yo tenía los cabellos presos y cortos apretando los muslos que empezaban a crecer. Un niño mayor pasó corriendo y, en un solo movimiento, sacó la cola de caballo y apretó mi culo – desapareció por los pasillos tan rápido como surgió. Paré sintiendo la cara calentarse, y di un suspiro largo. Entonces sentí una mano fría y grande en mi hombro.

No te deja hacer eso, no te mereces. Eso no es amor.

La muchacha tenía los cabellos cortos, el rostro anguloso y delgado, y algo en la forma de vestir y actuar que me dejaron en la duda por un instante -no más que eso- si era un hombre o una mujer. Su porte me impresionó tanto como su frase: “eso no es amor“. Justamente en la época mi madre, tías, amigas y hasta profesoras decían que los niños me molestaban porque yo les gustaba.

Creo que ella preguntó el nombre del niño, creo que dijo que iba a hablar con la directora. Sólo que lo más destacado ya estaba hecho, y ella imprimió su media-sonrisa en mi memoria. En los meses siguientes la miraba por los pasillos, pero después de las vacaciones ya no estaba allí, y la memoria desbotó, sin desaparecer jamás.

Se convirtió para mí en imagen de mujer fuerte, y con el tiempo también en imagen de lesbiana (que por algún motivo nunca tuve duda de que era) – en los años siguientes, durante mi adolescencia, siempre que veía o oía hablar de una “bollera “, recordaba su pelo corto y su ropa ancha.

Diez años después, vivía en el centro de la ciudad y como cualquier mujer trabajaba en casa, en la calle, y aún estudiaba. Antes de los veinte ya corría por la ciudad para garantizar mi supervivencia e intentar garantizar mi futuro. Después de mucho ir a vivir más cerca del trabajo, y un día corría para coger un autobús nuevo a la universidad. Chequeaba mi bolsa, miraba el celular, atravesaba calles a los saltos. De lejos vi en la plaza una figura pacífica regando una huerta comunitaria y saludando a dos señoras que pasaban con bolsas de compras. Miré de nuevo el celular mientras atravesaba, y percibiendo el inadmisible retraso de quince minutos, vacilé y pregunté por la parada: “Derecha o izquierda aquí?”. Ella se volvió, y entre zapatillas, camiseta, jeans, y una media-sonrisa, respondió gesticulando: “Por aquí, siempre a la izquierda”.

Presioné el paso en el retraso, pero sentía algo en el pecho que era como tratar de recordar un sueño. Tomé el autobús y sólo cuando me sentí percibí que era ella.

No podía concentrarme en aquel día, rocié las uñas y pasé meses tratando de volver a encontrarla. Hice por un mes el mismo camino, incluso después de descubrir un atajo, y bebí en la plaza todos los fines de semana del semestre siguiente. No pregunté a nadie, pero de noche antes de dormir a veces sobreponía el rostro de la inspectora y el de la mujer de la plaza, pensando en todas las semejanzas, excepto por la piel más gastada y por los hilos grises que comenzaban a surgir de una de las sienes.

En aquel día seguí a la izquierda y continué seguindo. El muchacho con quien salía en la época me empujó unos meses después y terminé todo sin querer más verlo-eso no es amor-pero sólo dos años después me convertí feminista, sólo después de cuatro besé a la primera mujer.

Besé una, dos, tres, en el tiempo en que besé a cinco o seis muchachos. Sentía las diferencias, pero me gustaba igualmente, y quedaba de cualquier manera un vacío de algo.

Conocí después a Rodrigo, el último hombre que me encantó. Tenía las ideas en el lugar, era cuidadoso y cariñoso. Fuimos a vivir juntos, y ella ya era, a mis 26, de nuevo sólo un fantasma en el fondo de mi fuerza.

Entonces poco antes de los 29 yo todavía trabajaba, en casa y en la calle, todavía estudiaba y estaba a la vuelta con proyectos feministas. Uno me llevó al interior para publicar un cuento, otro a las periferias de la ciudad, oír historias de mujeres. Todavía otro me rindió una invitación para un seminario en el Ayuntamiento, con mujeres de todo el país. La amiga que invitó llamó también para una cena con las visitantes y las organizadoras, en la noche de la víspera. Yo, que ya me cansaba de Rodrigo – vidas que giraban en falso, sus necesidades en el frente, pereza que crecía entre los cuerpos – me arreglé y salí feliz para conocer a mujeres.

Hablé con todas por toda la noche y de cuando en vez alguien le preguntaba de Amanda, la organizadora que mandaba los e-mails y estaba hasta esa hora a la vuelta con buscar a alguien en el aeropuerto. Cuando ya había comido demasiado, y evaluaba tomar otra cerveza, todos los rostros se volvieron en sonrisas a la puerta del restaurante.

¿Esa es Amanda? – fue todo lo que pude preguntar.

Porque después de que ella llegó algo me emocionaba en respirar el mismo aire. En ese día su sonrisa era plena, gesticulaba acelerada, se presentaba a todas y se derrumbó en una silla vaga frente a mí, cortando el pan con la mano y bebiendo la cerveza en goles largos. Provocó unas y otras, pasando la mano en el pelo ya grisáce y extendiendo su presencia sobre nosotras. Se tardó y tardé, no consiguiendo quitar los ojos de ella, del piercing en el canto del labio inferior, de las varias anillas en las orejas, del cuerpo delgado y de los ojos vivos. Volví a casa sin ver nada, y sólo volvía a ver al día siguiente, cuando el seminario comenzaba y la vi presa en un ordenador portátil en una de las filas del frente. Lo hice de todo para distraerme, pero en el almuerzo me obligé a sentarme a su lado, y puse distraída la mano en su espalda, no consiguiendo más lidiar con la distancia. La tarde me fui acercando, me quedé de pie a su lado, me senté atrás y pasé a ver todo atravesado por su perfil. Después del evento salimos todas, bebimos y conversamos, y no salí de su lado, incluso sin recibir señal que me autorizara a avanzar.

Ella se fue, apretó su mano en la despedida y luego fui a bailar, llegué a casa con la mañana y llorando mucho. Me soñó con ella, y en los días siguientes me quedé entre humores de melancolía y de alegría extrema. Traté de escribir cientos de mensajes, que apagaba a continuación. Tuve ideas de eventos, cuentos, libros y películas, paré horas delante de la televisión sin ver nada. Oí canciones románticas bailando violentamente, me quedé acostada horas sin conseguir dormir, dormí días sin conseguir salir de la cama.

Rodrigo reparó mi manera y me dio tiempo y más tiempo, hasta que un día preguntó directamente, si yo no le amaba más, se amaba a otra persona. Sí y sí, y una mujer. Bajó la cabeza y asentándose se fue para no volver más.

Unas semanas después Amanda me escribió, contando que iba a viajar unos meses, conocer a América Latina, cuando volviese a hablar.

Los mejores años de mi vida – ahora yo era independiente, sabía lo que quería y me sentía cada día más fuerte. Amanda viajaba mucho, pero siempre mandaba fotos, y una o dos veces al año reunía a algunas amigas para beber y conversar – me quedaba en ese círculo sólo de responderla siempre y estar siempre dispuesta a verla. Una de las veces nos quedamos solas en la madrugada bebiendo en unas escaleras del centro bajo una luna extraordinariamente iluminada. Ella rascó una de las mejillas, dejando la piel roja, y coló la latina de cerveza para aliviar. Estábamos tan cerca, pero ella miraba el cielo. En ese día conversamos por horas y horas, y yo tenía la sensación que pasaría la vida conversando con ella. Después de mucho extrae que de hecho ella trabajó en la escuela de mi infancia, lo que rindió algunos “como eres nueva!”. Hice toda una escena fingiendo que recordaba solo en aquel momento del día en que ella me aconsejó – entonces se puso roja y abrió su medio-sonrisa encubierta. Creo que percibió que yo estaba enamorada, me miró con ternura y se despidió con tristeza. El otro día dijo que no estaba bien para amar, y desapareció por otros meses en sus viajes

En esos años me casé dos mujeres que amé mucho, con caminos que se cruzaron pero no siguieron los míos. Una de ellas llegué a conocer a Amanda, que todavía me aceleraba el corazón, incluso después de tantos años. Seguíamos conversando por horas, por mensajes o enlaces, con grandes intervalos, y viéndonos de raro en raro. Seguía mi vida y ella me inspiraba todo el día – yo guardaba algunas fotos como tesoro en el fondo de la computadora.

Fueron años de colaboración intelectual, traducimos, escribimos artículos, y organizamos eventos juntas. Los años también en que sólo pensar en ella renovaba mis fuerzas. Una media docena de veces me salvó: cuando me quedé muy sacudida por un feminicidio – eso no es amor -, cuando mi madre y mi tía se pelearon feo – somos creadas para competir – cuando estaba asustada con la política – siempre a la izquierda.

Todavía me sentía nostalgia todos los días cuando, a mis 39, me llamó para su fiesta de jubilación, iba a parar de viajar, y morir en el centro hace unos metros de aquella vieja huerta comunitaria. Casi vecinas, comenzamos a regar las plantas todas las mañanas, después tomando cafés, y luego cenando juntas siempre. La convivencia constante con alguien que siempre estuvo en mi corazón fue haciendo mis días leves de no conseguir más envejecer.

Amanda fue la persona que amé, toda la vida, la mujer que más formó parte de mí, fue la mujer que amé amando ser mujer. Sólo años después ella aceptó mi beso, y me miraba en su vejez, entre las plantas de nuestro jardín, aún con su media-sonrisa, siempre me tratando de niña y siempre un poco sorpresa con mi amor.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *